quarta-feira, fevereiro 29, 2012

Vencedores e derrotados

Em Dezembro de 2011, o Banco Central Europeu liberou 498 mil milhões de euros à combalida banca da UE, um condensado de interesses formado por banqueiros e accionistas bastante activos no amplo ciclo de irresponsabilidades especulativas que precedeu à crise mundial de 2008.
Esse mega financiamento destinado a evitar a falência da engrenagem que emprestou a quem não devia e investiu no farto repertório de temeridades disponíveis na praça global, teve juro de 1% ao ano e prazo de três anos para pagar.
Na próxima 4ª feira, 29, o BCE abrirá novamente as torneiras para banhar a banca com outra chuva de dinheiro barato. Como da vez anterior, ninguém espera que a drenagem chegue à produção e ao consumo. A experiência da crise demonstra que o dinheiro entregue às casas financeiras fica entesourado nos BCs locais ou guarnece carteiras de títulos públicos confiáveis, que pagam bem mais que o custo do empréstimo, propiciando nova fonte de lucro fácil a quem navegou em todas as temeridades do fastígio rentista.
Compare-se esse encadeamento com as contrapartidas draconianas impostas à Grécia em troca de uma fracção do que foi e será liberado à banca (130 mil milhões de euros). Ademais dos sacrifícios em espécie, na forma de empregos, empobrecimento, privatizações, orfandade e soberania, a Grécia ainda pagará um juro de 3,65% ao ano pelo suicídio induzido, três vezes e meia superior à taxa cobrada da banca.
A esse juro e com desconto de apenas 53% sobre o passivo total - embora o valor de face dos títulos gregos já sofra desconto de até 70% no mercado, a dívida continuará impagável. Hoje ela equivale a 160% do PIB ou seja, a Grécia deve um ano e meio de toda a renda gerada no país.
Como o 'ajuste' empurra a economia para mais uma década de recessão ou crescimento residual, alcançar uma proporção dívida/PIB de 120% em 2020, como preconiza a troika do euro, soa fantasioso. A doutrina neoliberal costuma criticar a acção do Estado na economia, sobretudo as políticas oficiais de crédito ao desenvolvimento, pelo risco inerente, acusam, de “escolher os vencedores no lugar dos mercados”, o que configuraria uma interferência política na proficiência do laissez-faire para consagrar os mais eficientes e punir a inoperância cara (geralmente fabricantes locais que tentam ganhar mercado de monopólios exportadores).
O “resgate” grego compromete essa narrativa ao demonstrar que o juiz neoliberal quando age não apenas escolhe vencedores, como traduz as custas do processo num verdadeiro massacre dos derrotados.
Saul Leblon (cartamaior)

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segunda-feira, fevereiro 27, 2012

Os assassinos do projecto social democrata europeu

O projecto social democrata europeu foi o grande responsável pelo equilíbrio social e político da Europa ao longo dos anos de reconstrução do pós-guerra e de mais de quatro décadas de guerra fria. Hoje, sob o pretexto da crise fiscal, está sendo intencionalmente destruído pela direita política do continente que conseguiu fazer encastelar nos postos-chave da União Europeia e nos organismos multilaterais de regulação financeira verdadeiros assassinos da ordem social progressista que, mais do que várias divisões de tanques, havia sido a força de contenção do comunismo na Europa enquanto houve ameaça soviética.
Lembro-me do tempo em que Berlim Ocidental era a vitrina contra a qual a propaganda capitalista expunha as fantásticas vantagens de ordem social e económica do Ocidente comparada com a vizinha relativamente atrasada do Leste. A despeito do fantástico progresso material norte-americano, não eram os Estados Unidos, mas os Estados sociais democratas, trabalhistas ou socialistas europeus que se apresentavam como modelos de sociedade em face do regime soviético. A agressividade intrínseca da sociedade americana, com seu ritmo exacerbado de competição, não era algo a ser emulado. A Suécia generosa, sim.
É todo esse edifício social democrata que vemos agora ser demolido pela direita que assumiu e detém o poder nos Estados principais da Comunidade Europeia. Politicamente, jamais se viu algo parecido antes. As sociedades europeias, simultaneamente, entregaram o poder à direita na Alemanha, na França, na Inglaterra e na Itália, sem falar nos países menores. Varreram do mapa, literalmente, os progressistas. Claro, o que me espanta, junto com essa convergência, é a extraordinária incompetência das esquerdas e dos progressistas em apresentarem às sociedades uma alternativa política ao desastre que se aprofunda.
Os assassinos da ordem social democrata juntaram políticos e tecnocratas para eliminar as poucas dessas características que o Estado norte-americano, a mais atrasada entre as democracias sociais, tentou construir ao longo do tempo - aí incluída a lei de protecção à saúde em favor dos mais pobres que Barak Obama, com extrema dificuldade, fez aprovar no início do seu mandato. A aprovação dessa lei suscitou ódio dos ricos, e muitos republicanos mantêm na agenda o propósito de eliminá-la.
A direita dos dois lados do Atlântico jamais aceitou o projecto social democrata, de um lado, ou politicamente liberal, de outro. Na realidade, também nunca teve, antes, poder político absoluto para impedi-lo ou revertê-lo. Na época de Reagan e Thatcher, por exemplo, a direita democrata cristã assumiu o poder na Alemanha mas os sociais democratas e socialistas estavam no poder na França e na Itália. Seus líderes converteram-se ao neoliberalismo, mas enquanto havia União Soviética a direita social não se atrevia a desmontar o Estado do bem-estar social, excepto na margem, como a Inglaterra.
Agora, o presidente do Banco Central Europeu, Mario Draghi, na mais clara demonstração de que seu mandato é político, e não técnico, ousa decretar a necessidade da morte do projecto social-democrata para salvar a produtividade europeia. Só o conforto de se ver apoiado pela direita política que domina inteiramente a Europa poderia justificar essa arrogância. É claro, porém, que isso não é o fim da história. Por muito menos a Europa se incendiou em 68. O que talvez retarde a extensão do incêndio a partir da Grécia seja a falta de alternativa apresentada pelas esquerdas tradicionais.

J. Carlos de Assis (Ler mais cartamaior)

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quinta-feira, fevereiro 23, 2012

Grécia, um protectorado da banca

O “acordo” de ajuste assinado entre Atenas e a troika do euro na madrugada desta 3ª feira, em Bruxelas, passará à história como o mais draconiano e humilhante exemplo da rendição de um país aos mercados em tempos modernos. O que se deliberou é pior até que os termos devastadores do Tratado de Versalhes, de 1919, que colocou a derrotada Alemanha da Primeira Guerra de joelhos, impondo-lhe reparações equivalentes a 3% de um PIB em frangalhos, ademais de autorizar os saques de fábricas e da então poderosa marinha mercante germânica.
O que se decidiu em Bruxelas neste 21 de Fevereiro de 2012 conecta as gerações gregas do presente e do futuro a um implacável sistema de transfusão que as condena a servir aos credores até a morte. Todo o dinheiro do “socorro” acertado (130 mil milhões de euros) - liberto em troca de demissões em massa, corte de salários e pensões, vendas de património público, supressão de serviços essenciais e até de medicamentos à rede pública de saúde - não poderá ser tocado pelo Estado grego.
Depositado em conta bloqueada e supervisionada por um directório do euro, o recurso será destinado prioritariamente ao pagamento de juros aos credores. Troca-se assim um desconto de 53% sobre titulos que enfrentam uma desvalorização no mercado superior a isso, por juros sagrados. Ao aceitar a lógica da coacção, Atenas renunciou ainda à soberania orçamental. A partir de agora, as contas do país passam à condição de protectorado de uma junta da troika sediada fisicamente no coração do Estado grego, com poder de veto sobre decisões de governo.
Dentro de dois meses a Grécia vai às urnas eleger um novo parlamento; a esquerda tem 40% das intenções de voto e mais de um centurião do governo alemão já sugeriu adiar o pleito, para o bem do ajuste. O que se acertou em Bruxelas nesta madrugada foi ainda pior: a troika arrancou de Atenas a promessa de que o acordo está acima do que decidirem as urnas em Abril. Por outras palavras, a elite política grega comprometeu-se também a ceder a soberania democrática aos mercados, tornando inalteráveis os termos do arrocho. Ao reduzir uma nação a uma entidade excretora de juros, expropriada de soberania orçamental e política, Bruxelas, involuntariamente, emitiu a mais pedagógica e contundente convocação à resistência contra a agenda ortodoxa dominante na UE.
De agora em diante fica claro que a escolha é resistir nas ruas ou render-se à servidão financeira.
Saul Leblon (cartamaior)

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segunda-feira, fevereiro 20, 2012

Uma Nova Esquerda

Só uma Nova Esquerda poderá opor-se e combater o projecto social da Nova Direita que, num claro aproveitamento da crise, anseia implementar no país a todo o custo e com a maior celeridade; projecto social, recheado de “novas reformas estruturais”, todas elas de cariz anti-social - cortes sociais, venda do património do Estado, desregulação laboral e diminuição dos salários e pensões.
Uma Nova Esquerda que faça frente ao vulgar “europeísmo” unicamente apostado em legitimar sem discussão as actuais políticas de austeridade.
Hoje, quer as lideranças sociais-democratas europeias, quer as lideranças socialistas ou trabalhistas, adoptaram como seus os ideais neoliberais e as políticas anti-sociais a eles associados que, e enquanto governos, vêm aplicando na Europa. As classes trabalhadoras, os pequenos comerciantes e os pequenos empresários, deixaram de ser representadas por aqueles que até aqui representavam os seus interesses sociais. Ao tomar partido pelas ideias neoliberais, as esquerdas europeias passaram a defender os interessas das oligarquias financeiras, do capital financeiro, hoje dominante na economia europeia.
A ideia que foi propagandeada e acabou por ser assimilada pelos portugueses de que a entrada no euro lhes proporcionaria uma convergência com os países mais desenvolvidos em salários e bem-estar, que a economia portuguesa entraria numa fase de crescimento duradouro em benefício de todos, não passou de uma grande mistificação, de uma grande mentira. Na verdade, acentuaram-se as divergências e as dificuldades económicas com a destruição imposta das nossas capacidades produtivas nas pescas, na agricultura e na indústria. Perdemos a capacidade de criar moeda e assim o meio de pagamento das dívidas públicas.
O euro, representa e simboliza as políticas neoliberais extremas que hoje dominam a União Europeia.
Uma Nova Esquerda que não se resigne ao empobrecimento, a uma nova escravidão económica imposta pela oligarquia financeira europeia. Que saiba lutar com coragem e eficácia contra a chantagem exercida sobre a população através do medo de falência do Estado.
Com o prosseguimento das actuais políticas os portugueses só poderão esperar dias ainda mais negros, sem qualquer esperança de futuro. Ao contrário das crises económicas anteriores, a degradação económica das famílias não será reversível, mas tornar-se-á permanente e duradoura. Trata-se na verdade, de um retrocesso civilizacional imposto à maioria da população como resultado de uma distribuição da riqueza cada vez mais desigual.
Um futuro destes jamais poderá ser aceite sem contestação e revolta.

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sexta-feira, fevereiro 17, 2012

A HORA DA MAIS-VALIA: A FASE DOIS DA CRISE

A Europa mergulha de cabeça na fase dois da restauração pós-crise.
Depois de recapitalizar a banca e tornar confortável a liquidez e a retomada dos lucros rentistas, seus mandatários decidiram apresentar a conta a quem de direito: os trabalhadores. As ruas rangem e rugem: cerca de meio milhão de pessoas protestaram em Atenas e Lisboa, contra o ataque frontal a salários e direitos. Os sindicatos espanhóis marcaram uma greve geral a partir deste domingo, dia 19: a reforma laboral decretada pelo direitista Rajoy dá ao patronato da Espanha o direito leonino de cortar salários, demitir e esfolar, sem ónus, nem negociação. O desespero que incendeia as ruas, porém, encontra ouvidos moucos numa esquerda destituída do traço indispensável à liderança de uma época: a coragem para romper com as amarras de um passado que sufoca a sociedade.
Saul Leblon (cartamaior)

domingo, fevereiro 12, 2012

projecto de reforma ideológica

De um lado os responsáveis e trabalhadores, do outro, os irresponsáveis e mandriões. Pelo meio, a “pieguice” e outros mimos semelhantes. Estas considerações de Passos Coelho, divulgadas nas suas últimas intervenções públicas, revelam sobretudo, para além de uma leviana grosseria para com os portugueses, a sua admiração e desvelo para com os teóricos do neoliberalismo.
Na verdade, o que Passos Coelho pretende transmitir com este tipo de discurso, é o que os teóricos do neoliberalismo vêm propagando há muito:

“Os homens não nascem iguais, nem tendem à igualdade. Logo, qualquer tentativa de suprimir a desigualdade é um ataque irracional à própria natureza das coisas. Deus ou a natureza dotou alguns com talento e inteligência mas foi avaro com os demais. Qualquer tentativa de justiça social torna-se inócua por que novas desigualdades fatalmente ressurgirão. A desigualdade é um estimulante que faz com que os mais talentosos desejem destacar-se e ascender ajudando dessa forma o progresso geral da sociedade. Tornar iguais os desiguais é contraproducente e conduz à estagnação”.
Ou ainda: “a sociedade é o cenário da competição, da concorrência. Se aceitamos a existência de vencedores, devemos também concluir que deve haver perdedores. A sociedade teatraliza em todas as instâncias a luta pela sobrevivência. Somente os fortes sobrevivem cabendo aos fracos conformarem-se com a exclusão natural. Esses, por sua vez, devem ser atendidos não pelo Estado, que estimula o parasitismo e a irresponsabilidade, mas pela caridade feita por associações e instituições privadas, que amenizam a vida dos infortunados. Qualquer política de assistência social mais intensa atira os pobres nos braços da preguiça e da inércia. Os ricos são a parte dinâmica da sociedade. Deles é que saem as iniciativas racionais de investimentos baseados em critérios lucrativos. Irrigam com os seus capitais a sociedade inteira, assegurando a sua prosperidade”.

Trata-se de colocar em prática um processo de reconstrução discursivo-ideológico, num ambicioso projecto de reforma ideológica da sociedade e a construção e difusão de um novo senso comum.
O neoliberalismo, e os partidos desta "Nova Direita" têm consciência de que o Estado de Bem Estar Social ou as políticas sociais, não eram apenas uma "administração", mas um modelo civilizacional. As narrativas desda "Nova Direita" estão voltadas para demolir tal modelo, até aqui consensual, e substituí-lo por outro.

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sábado, fevereiro 11, 2012

300 mil no Terreiro do Paço

Os 20% (ricos) que se cuidem!
Mesmo que os 300.000 possa ser um número algo exagerado, o certo é que foi uma grande manifestação.

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Polícia ameaça emitir mandatos de captura para membros da troika

O maior sindicato da polícia grega já veio, contudo, acusar os representantes da troika de "chantagem" e de estarem a contribuir para a "abolição ou desgaste da democracia e soberania nacional". A estrutura sindical ameaça mesmo emitir uma série de mandatos de prisão que abrangeriam, entre outros, Poul Thomsen, responsável do FMI na Grécia.
"Alertamos que, enquanto representantes legais dos policiais gregos, vamos emitir mandatos de prisão por uma série de violações legais ... como chantagem, abolição ou corrosão de forma secreta da democracia e soberania nacional", refere inda a estrutura sindical que abrange mais de de dois terços dos polícias gregos.

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quinta-feira, fevereiro 09, 2012

Ângela Merkel e o novo nacionalismo alemão

Os nacionalismos não desapareceram. Nem as nações. Basta olhar hoje a Europa que treme sob a adrenalina quinzenal que os problemas do euro derramam nas bolsas, nos parlamentos, e nas veias do mundo inteiro. A City londrina recusa-se a se colocar sob a supervisão financeira de Bruxelas e Frankfurt. Nicolas Sarkozy se viu forçado a aceitar a liderança germânica na frente europeia – mas resmungando – e isso pode custar-lhe a reeleição em abril/maio.
Na frente do parlamento grego, nesta terça-feira, manifestantes queimaram uma bandeira alemã. A zona do euro soçobra devido à disparidade nas diversas políticas económicas nacionais postas em curso sob o escudo único da nova moeda. Não só isso: depois de um documento confidencial do Ministério das Finanças alemão recomendar a nomeação de um interventor financeiro na Grécia (depois da “troika”, o Banco Central Europeu, o FMI e a Comissão Europeia, ter nomeado um interventor no governo), a dupla Merkozy aventou a proposta de criar uma “conta bancária bloqueada” para depositar as ajudas financeiras àquele país, só liberando-se fundos com a anuência dos administradores do bloqueio, ou seja, a “troika”, ou seja, Merkozy, ou seja, Ângela Merkel.
Entretanto, há um país em que esses “nacionalismos” não parecem ter eco: a Alemanha. Claro: existe o velho nacionalismo rançoso de extrema direita, neo-nazi. Mas ele é minoritário, embora perigoso. Claro: existe a xenofobia difusa que vê no estrangeiro, particularmente no imigrante muçulmano, uma ameaça, assim como existe um racismo difuso no Brasil. Mas não é a isso que me refiro. Outro tipo de nacionalismo está em ascensão.
É um nacionalismo baseado no que se pode chamar “as virtudes teologais do capitalismo alemão”. A Alemanha deveria servir de exemplo para a Europa e para o mundo, graças à sua contenção, à sua fidelidade aos “planos de austeridade”, ao seu exemplo de ter comprimido salários e aumentado a idade da aposentadoria, ao seu exemplo de uma fidelidade à toda prova ao ideário liberal de von Hayek, que permanece hegemónico nas suas universidades, no pensamento económico e na vulgata mediática sobre a crise europeia, um ideário a que mesmo o social-democrata SPD e o anti -atómico Partido Verde parecem ter sucumbido.
Flávio Aguiar (cartamaior)

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as dívidas

Vinte e oito deputados de diferentes partidos requereram no Parlamento grego o agendamento de um debate sobre o “empréstimo de ocupação” pago pelo governo colaboracionista grego à Alemanha durante a Segunda Guerra Mundial, bem como sobre as reparações às vítimas do nazismo e sobre os tesouros roubados pela ocupação.
Segundo cálculos feitos pelo jornal económico francês Les Echos, a Alemanha deverá à Grécia nada menos que 575 mil milhões de euros a valores atuais. Atenas tem tentado cobrar essa dívida, sem sucesso, desde o fim da Segunda Guerra. Fê-lo em 1945, 1946, 1947, 1964, 1965, 1966, 1974, 1987 e, após a reunificação, em 1995.
O governo alemão, que tanto insiste que todos devem pagar as suas dívidas, recusa-se porém a sequer discutir a questão. Ao mesmo tempo, é inflexível na exigência de draconianas medidas de austeridade para que a Grécia possa pagar a sua dívida soberana.

terça-feira, fevereiro 07, 2012

custe o que custar



Passos Coelho mentiu em campanha eleitoral. Do ”disparate” em que consistia o retirar dos subsídios de Natal e Férias, segundo as suas palavras, passámos agora, quando imagina encontrar-se solidamente instalado no governo, ao “custe o que custar”. E neste curto percurso vem ao de cima sobretudo o seu distorcido e mau carácter, não apenas pela apologia de políticas contrárias a tudo o que prometeu em campanha, mas também por mais um logro em que quer fazer embarcar os portugueses. Com uma dívida pública já superior a 110% do PIB, quando em 2007 rondava os 68%; com uma taxa de desemprego em 13,6% quando em 2007 se situava em 8%; com uma recessão de 3% quando em 2007 tínhamos um crescimento de 1,9%; com um pagamento em 2012, só de juros da dívida pública, de uma despesa equivalente a 5,5% do PIB, quando em 2007 era apenas de 2,8%; com as medidas de austeridade impostas que provocam inequivocamente mais recessão; com uma crise de crédito às pequenas e médias empresas sem o lançamento de quaisquer medidas de apoio; quando a União Europeia não consegue inverter ou sequer estancar a crise do euro, agravando-se pelo contrário todos os índices económicos europeus; assim, prometer que o país volta aos mercados em 2013, é seguramente uma tremenda falsidade. Passos Coelho propagandeia e tenta fazer cair os portugueses em mais este tremendo logro.
Do “custe o que custar” à “pieguice”, discurso com que mimoseia os portugueses, Passos Coelho está rapidamente a transformar-se num desabrido e perigoso lunático.

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segunda-feira, fevereiro 06, 2012

O BCE e a dívida pública



Deixem-me emitir e controlar o dinheiro de um país e não me importa quem faz as leis
Mayer Amschel Rothschild, 1790

Com a entrada de Portugal no euro, o país perdeu, pela primeira vez desde a sua fundação em 1.143, a capacidade de criar moeda. A soberania monetária foi transmitida a uma nova instituição da União Europeia, o BCE.
Portugal entregou de mão beijada a sua independência financeira e económica a uma entidade, o banco Centra Europeu (BCE), governada por tecnocratas, oriundos das instituições financeiras privadas e naturalmente defensores dos seus interesses. Portugal abdicou assim, do mais importante mecanismo de controlo da sua independência financeira e económica. Quem dispõe da capacidade de criar dinheiro possui também a capacidade de saldar as suas dívidas públicas, contraídas para saldar défices ocasionais. Os Estados Unidos, por exemplo, possuem uma dívida pública astronómica, mas jamais se tornarão insolventes uma vez que a reserva federal criará todo o dinheiro indispensável aos pagamentos dessa dívida.
De algum modo, essa incapacidade dos países da união monetária de criarem moeda poderia ser atenuada se, o novo organismo supranacional criado, o BCE, se substituísse aos países na emissão de moeda e pagamento das dívidas soberanas de cada país. Não foi esta contudo a arquitectura engendrada pela UE ao proibir a emissão de moeda para o financiamento das dívidas públicas ou garantir os seus pagamentos, mesmo em caso de emergência. Os países ficaram assim totalmente desprotegidos, de mãos atadas, ao sabor da especulação dos mercados financeiros. É este o actual papel do BCE, favorecer e incitar objectivamente as instituições financeiras, as oligarquias financeiras, a especular com as dívidas soberanas dos países da união monetária que deriva da imposição do financiamento do BCE, incluindo o realizado com a criação de nova moeda, só poder ser destinado à banca privada, a juros de 1%, para que esta por sua vez, através dos mercados, compre dívidas soberanas a juros muitíssimo superiores.
A transferência de poder financeiro para o BCE que se deu com a criação da moeda única, significou na prática, um autêntico golpe financeiro, pelo qual um poder fundamental do estado, a criação de dinheiro como activo de reserva e garantia de dívidas, foi transferido às elites financeiras multinacionais, à margem dos governos democraticamente eleitos. Um poder que deveria ser utilizado para defender interesses sociais foi deste modo privatizado e colocado ao serviço de interesses privados.
(texto adaptado de “A chantagem da dívida na Europa” de Jesús Rodríguez Barrio, em Jaqueal Neoliberalismo)

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sexta-feira, fevereiro 03, 2012

Salvar os bancos, arruinar a economia


Josetxo Ezcurra
O BCE, a UE, o Merkozil encontram-se obcecados com um único propósito - o resgate e o fortalecimento do sistema financeiro. Para eles, tudo deve ser sacrificado a este superior desígnio. Os rendimentos das populações, os salários e as pensões, os direitos sociais adquiridos ao longo das últimas décadas, a economia real e até, pasme-se, a própria vigência democrática, como são os casos da Grécia e da Itália em que a governação democrática foi substituída por comissários do sistema financeiro.
Depois dos 489 mil milhões de euros o BCE prontifica-se a oferecer-lhes mais um bilião de euros. Ao mesmo tempo, a troika exige aos países a mais severa austeridade sacrificando as populações e debilitando a economia real. Oferece-lhes todo o dinheiro que desejarem, a um juro de 1% e sem a imposição de quaisquer condições que garantam a fluidez de crédito às empresas produtivas. No que resulta a paralisação da actividade produtiva como agora se verifica. As oligarquias financeiras preferem utilizar tais recursos em operações mais lucrativas – no negócio altamente rentável das dívidas soberanas.
Se recuarmos até 2007 observamos que não existia então o problema das dívidas soberanas que agora infernizam os países. A dívida pública de Portugal mantinha-se na casa dos 60% (68,2%) o mesmo acontecendo com a Espanha (36,2), a Irlanda (24,8%), com uma média europeia (UE25) em 59,6%. Em 2010, a dívida pública portuguesa saltou para (93,3%), o mesmo acontecendo com os outros países, 61,0%, 92,5% e 80,8% respectivamente. Existia contudo em 2007, uma profunda crise nas instituições financeiras. A opção da UE, tomada pelos seus líderes em reuniões de emergência, foi a de lançar operações de salvamento e resgate das instituições financeiras à custa dos orçamentos nacionais dos países da união europeia. A dívida pública contraída desde então com este propósito, acabou por colocar os países em situações de insustentabilidade orçamental como é caso de Portugal, da Grécia, da Irlanda e mesmo da Espanha e da Itália. Os títulos da dívida pública emitidos pelos países para resgatar os bancos não deveriam ser considerados como “dívida pública” mas como um empréstimo a ser pago pela banca e não pela população.
À custa dos sacrifícios da sociedade, reforçou-se o poder dos banqueiros e das instituições financeiras, ao ponto de serem elas próprios, pasme-se, a imporem condições aos paíse para a “saída” da crise.

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quinta-feira, fevereiro 02, 2012

Os direitos sociais



Os direitos sociais (conceito mais correcto que direitos adquiridos) foram conquistados ao longo do tempo, ao longo da evolução histórica do Homem. A abolição da escravatura, a liberdade sem escravatura, é um direito adquirido. A democracia, a capacidade de votar, é um direito adquirido. A liberdade política, a livre expressão, é um direito adquirido. São direitos sociais da mesma natureza do direito adquirido das 40 horas semanais de trabalho, do direito adquirido da liberdade sindical ou do direito adquirido à greve.
Colocar em discussão direitos sociais por razões económicas, manifestamente ocasionais e resultantes da adopção de políticas anti-sociais, é naturalmente possível mas não é eticamente justificável. Na verdade, a riqueza produzida na UE tem sempre crescido em cada ano que passa, verificando-se contudo e paralelamente, uma distribuição desigual dessa riqueza, causa das sucessivas e cada vez mais baixas receitas orçamentais dos Estados. Estados que abdicaram do seu papel de administrarem através da fiscalidade, da regulação e apoios sociais uma redistribuição equitativa da riqueza criada.
As desigualdades sociais assim geradas tornam-se objectivamente a causa desta ofensiva contra os direitos sociais. Em Portugal, o penúltimo país com maiores desigualdades sociais nas estatísticas da União Europeia, enquanto o PIB aumentou de 41,33% entre 1994 e 2007 o salário médio dos trabalhadores portugueses no mesmo período apenas subiu de 14,32% (dados a preços constantes “pordata”).
Mas bastará observar o que se passa nos países nórdicos para demonstrar a falácia dos argumentos dos defensores dos cortes dos direitos sociais. Países onde as taxas de crescimento económico são das mais elevadas da Europa e, ao mesmo tempo, onde os estados sociais são dos mais fortes e abrangentes da UE.

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quarta-feira, fevereiro 01, 2012

O BCE, a UE, o Merkozil e o capital financeiro

Josetxo Ezcurra
O BCE, prepara-se para injectar em Fevereiro um bilião de euros no sistema financeiro europeu, nos bancos europeus, prontificando-se desde já estar disposto a ultrapassar esse montante se tal for necessário, depois dos 489 mil milhões oferecidos em Dezembro. A um juro de 1%. Enquanto isto, nega-se o empréstimo directo aos países da UE em dificuldades económicas e financeiras,  obrigando-os a pedir empréstimos aos mercados a juros de 4 e 7%, isto é, precisamente aos bancos que recebem de mão beijada tais benesses do BCE.
Há algo de errado em tudo isto. Os poderes políticos e económicos da UE, o BCE, a CE, os Merkozil, apoiam incondicionalmente o sistema financeiro, sabendo que actuando deste modo sacrificam selvaticamente os povos europeus. Os pagamentos dos juros altos das dívidas soberanas pelos países em dificuldades, só poderão advir do agravamento de impostos e cortes de direitos sociais há muito conquistados. Esta obscena operação de transferência financeira mostra-se com toda a clareza, sem qualquer dissimulação (o que demonstra o desaforo a que chegou o capital financeiro) - retiram-se rendimentos às populações para os entregar ao sistema financeiro.
Ataca-se a economia real, porque baixar rendimentos à generalidade da população é atacar a economia real, para se proteger a “economia financeira”, o sistema financeiro. Desprezam-se os custos humanos para preservar a riqueza financeira quando o mecanismo que a suporta - a economia real - se torna por aquela razão, irónica e dramaticamente, cada vez mais insustentável.
A selvajaria do capitalismo neoliberal mostra-se às claras, sem máscara e sem vergonha, sem medo, só possível pela capitulação total do que anacrónocamente ainda se chama de "esquerdas", dos partidos "socialistas" e sociais democráticos europeus.
   

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