segunda-feira, julho 30, 2012

As dívidas públicas e os mercados

A chamada, erradamente, crise das dívidas públicas, não resulta do endividamento dos países como se pretende fazer crer, ainda que tal constitua um problema, mas da especulação financeira dos mercados financeiros. Os especuladores passaram a encarar o mercado da dívida pública como um outro qualquer mercado de commodies. E, começaram a especular nos países do euro, porque a própria estrutura da UE tal como se encontra lho permite. Isto é, os países da UE estão prisioneiros e à mercê dos mercados, ao não possuírem moeda própria e capacidade de emitir moeda, ao não terem meios de controlo da sua política monetária. E, não há estrutura comunitária que possa substituir ou compensar aquele controlo monetário nacional. Tornou-se assim fácil aos mercados especularem com as dívidas públicas dos países do euro.
Os exemplos são bem demonstrativos do que afirmamos. A Espanha, com uma dívida pública em 2007 (início crise) de 27% do PIB e com um orçamento excedentário, encontra-se sujeita a uma sufocante especulação com a sua dívida soberana, que já ultrapassou os 7,5%. Ao contrário, verificamos que o Japão com uma dívida soberana de mais de 200% do PIB continua com juros da dívida de 0,78%; ou os USA com uma dívida de mais de 100% do PIB e um défice orçamental de 9% (2011) com juros de apenas 1,51% ou ainda o Canadá com uma dívida de 84% e com juros de 1,72%.

Para uma política de direita neoliberal é cómodo atribuir ao endividamento dos países a causa do aumento dos juros das suas dívidas soberanas. É cómodo e vantajoso porque lhe permite, com tal falso argumento, fazer o chamado ajustamento (leia-se empobrecimento), isto é, aumentar as desigualdades sociais e reduzir ou aniquilar o estado social. Satisfazer os anseios com que sempre sonhou - diminuir salários, reduzir apoios sociais, reduzir ou eliminar direitos laborais, enfraquecer os sindicatos, privatizar o património do Estado, reduzir ao mínimo as tarefas do Estado e transferi-las para a actividade privada.
É uma enorme mistificação que desresponsabiliza os verdadeiros responsáveis da crise e faz recair sobre as famílias as culpas da miserável situação que eles próprios forjaram.

sábado, julho 28, 2012

Zelosos mandatários

O cidadão comum europeu interroga-se com razão – como é possível que países desenvolvidos, com fortes economias como a Espanha, em 2007 com uma dívida pública diminuta, inferior a 40% do PIB (muito aquém da média dos países mais desenvolvidos, inferior à da Alemanha), com um superavit das suas contas públicas (também aqui numa situação favorável e melhor que a da Alemanha) se encontre agora com o custo da sua dívida a juros insuportáveis?
Como foi possível a Espanha cair no mesmo círculo vicioso em que caíram a Grécia, a Irlanda e Portugal, um país com uma economia superior em dobro às economias somadas daqueles três países? Um círculo vicioso, uma espiral suicida sem fim à vista, que se desenvolve em vários actos.
Primeiro acto - a especulação dos “mercados” financeiros encarece o custo da dívida.
Segundo acto - os governos anunciam cortes e aumento de impostos para acalmar os “mercados”.
Terceiro acto - os “mercados” aliviam e multiplicam-se os sorrisos durante alguns dias ou apenas algumas horas; a Alemanha o FMI e o Banco Central Europeu elogiam as corajosas medidas adoptadas, mas alertam que é necessário um maior esforço.
Quarto acto - renova-se a especulação dos “mercados” e repetem-se, pela mesma ordem e com os mesmos actores, todos os actos anteriormente representados.
Os governantes europeus têm demonstrado uma total e confrangedora incapacidade para superarem a actual crise. Nem outra coisa seria de esperar. Então não foram as políticas destes governantes que levaram os países à crise em que agora se encontram? Como então esperar deles uma efectiva solução de superação da crise? Com as suas políticas neoliberais de globalização dos mercados completamente desregulados que outra coisa se poderia prever? Estes governantes parecem não entender o actual funcionamento altamente perverso dos mercados financeiros, razão primeira e fundamental da actual crise. Torna-se mesmo caricato, absurdo e estúpido o apelo que alguns fazem aos seus cidadãos para aceitarem a austeridade como condição para “acalmar os mercados”. Criaram um monstro, um mercado financeiro global completamente desregulado e agora queixam- se da sua voracidade, da sua ganancia, da sua falta de “moderação”.
Qualquer especulador, em qualquer parte do mundo e a qualquer hora, pode aceder aos “mercados” e negociar qualquer commodities, petróleo, arroz, açúcar café, soja, trigo, cobre, comprar milhares de barris de petróleo ou toneladas de arroz, sem que alguma vez pense em consumi-los. O que o move é a expectativa de vendê-los com lucro. Não é a maior ou menor produção ocasional de uma mercadoria, como seria normal, que afecta o seu preço no mercado mas a acção determinada e consertada dos especuladores. Num dia o preço do petróleo sobe não porque a diminuição da produção se tenha verificado nesse dia mas apenas por acção dos especuladores. E o dinheiro que entra em especulação é imenso. Num estudo recente do The Guardian, o enriquecimento dos multimilionários através dos paraísos fiscais, soma mais de 21 bilhões de dólares, (o PIB somado dos USA e Japão) e a cifra pode chegar aos 32 bilhões como afirma o artigo. É este o “admirável” mundo do mercado financeiro globalizado livre, leia-se desregulado, criado e alimentado pelas elites governantes europeias e dos USA.
Com uma agravante – os especuladores lembraram-se, com êxito, face às altas rentabilidades que experimentaram, de atacar de igual modo e com a mesma determinação as dívidas públicas dos países soberanos. É esta brutal especulação, nunca antes observada, que tem arrastado os países europeus, primeiro os economicamente mais débeis, para as crises económicas e sociais sem fim à vista.
E será por esta razão, a manterem-se as actuais “liberdades” dos mercados financeiros, que jamais se poderá ultrapassar a chamada crise das dívidas soberanas por mais austeridade que estupida e criminosamente se imponham aos povos. Torna-se penoso, observarmos como a crise se tem arrastado, cimeira após cimeira, com os líderes europeus a assistirem apáticos à especulação dos mercados ao mesmo tempo que vêm impondo injustificadas e desajustadas políticas de austeridade. Não têm motivação nem capacidade para enfrentarem os mercados, os especuladores, as instituições financeiras. Porque na verdade agem como seus mais zelosos mandatários.

sexta-feira, julho 20, 2012

A crise do euro mantem-se e acentua-se

Hoje, em Espanha, prémio de risco supera os 600 pontos, juros da dívida acima de 7,2%, Bolsa em queda de 6%.

quinta-feira, julho 19, 2012

Sadismo económico

Sadismo? Sim, sadismo. Como chamar de outro modo a essa satisfaçãoem causar dor e humilhação às pessoas? Nestes anos de crise, temos visto como – na Grécia, na Irlanda, em Portugal, na Espanha e noutros países da União Europeia (UE) – a inclemente aplicação do cerimonial de castigo exigido pela Alemanha (congelamento e diminuição das pensiones; adiamento da idade da aposentação; redução da despesa social; cortes nos serviços do Estado Social; diminuição dos fundos para a prevenção da pobreza e da exclusão social; reforma laboral, etc.) tem provocado um vertiginoso aumento do desemprego e dos sem abrigo. A mendicidade disparou. Assim como o número de suicídios.
Apesar do sofrimento social alcançar níveis insuportáveis, Angela Merkel e seus seguidores (entre eles Mariano Rajoy) continuam afirmando que sofrer é bom e que isso não deve ver-se como um momento de suplício senão de autêntico júbilo. Segundo eles, cada novo dia de castigo nos purifica e regenera e nos aproxima da hora final do tormento. Semelhante filosofia da dor não se inspira no Marquês de Sade senão nas teorias de Joseph Schumpeter, um dos pais do neoliberalismo, que pensava que todo o sofrimento social cumpre de algum modo um objectivo económico necessário e que seria um erro mitigar esse sofrimento ainda que apenas ligeiramente.
Ignacio Ramonet (Ler texto completo em monde-diplomatic)

terça-feira, julho 17, 2012

sistema financeiro totalmente corrupto e fraudulento

Se a crise que rebentou há quatro anos nos deu a conhecer um sistema financeiro totalmente corrupto e fraudulento, o que se viveu desde então tem sido sobretudo uma acérrima luta para manter de pé esse cadáver. Todo este culto à chamada “banca zombie” foi o que afundou ainda mais a economia mundial.
Muito se debate – e as pessoas se debatem – sobre a permanência e a pertinência do euro. A opinião dominante no senso comum construído por governantes e mídia na Europa é a de que o euro foi bem pensado mas mal construído. Daí para a frente as razões da má construção variam, mas se concentram em torno da idéia de que alguns países – como a Grécia – que foram admitidos não deveriam ter entrado para o clube.
Passa-se então à interminável discussão sobre se é melhor para todos que alguns países – sempre se evoca o exemplo da Grécia – ficassem ou saíssem do euro. Sair do euro, nos discursos, varia da salvação à danação.
Para muitos sair do euro significaria recuperar a soberania sobre a própria moeda, e portanto poder nadar por conta própria no oceano desvairado em que a Zona do Euro se transformou. Para outros, sair do euro significa mergulhar no inferno, uma vez que a desvalorização inicial da moeda multiplicaria o valor da dívida soberana, mergulhando quem saísse no caos e no desespero.
De todo modo, reina a idéia de que governos descontrolados se endividaram de tal modo que comprometeram a saúde da moeda, e que a causa desse descontrole é, grosso modo, um desproporcionado estado do bem estar social: pensões muito altas, salários demasiados para trabalhadores, sobretudo no setor público, auxílios indevidos para desempregados que desestimulam a procura de emprego (como se eles abundassem).
Pouco se fala em sonegação, pouco se fala sobre a licensiosidade vergonhosa do sistema bancário (embora se fale sobre sua má administração), pouco se fala sobre os escandalosos salários e “sidebenefits” pagos para os que administraram e vão continuar administrando essa confusão.
O estado de arte sugere uma profunda, generalizada e superficial desinformação sobre esses temas, com resultados dramaticamente contraditórios.
O problema está na manutenção ou não dos atuais gestores da zona do euro e do sistema financeiro em seus postos. E não se trata apenas de uma questão que afete os governos de plantão. Há os banqueiros, os gestores, os gerentes, os sabichões (“pundits”, como diz Paul Krugman) da mídia, as escolas e os professores das escolas de economia e administração, para quem qualquer outra alternativa à ortodoxia econômica é uma irrelevância passadista, e que odeiam mais Keynes do que o próprio Marx.
Flávio Aguiar (texto completo em Carta Maior)