sexta-feira, novembro 29, 2013

EM DEFESA DO 25 DE ABRIL

Do rio que tudo arrasta, diz-se que é violento. Mas ninguém chama violentas às margens que o comprimem. (Bertolt Brecht)
 
A maioria dos portugueses terão já compreendido, com maior ou menor consciência, que o que está realmente a acontecer no país com as políticas de austeridade impostas pelo governo Passos/Portas, é um verdeiro golpe de estado contra a Constituição, contra as conquistas democráticas alcançadas com o 25 de Abril de 1974. De há muita que a direita portuguesa procurava uma desforra do 25 de Abril. A oportunidade bateu-lhes agora à porta com a crise financeira que atingiu a europa e muito especialmente os países do sul europeu.
De há muito que a direita portuguesa tinha compreendido que o estado social, a democracia com base no bem-estar social, é um modelo civilizacional onde os mais ricos são obrigados pelo Estado a ceder progressivamente, através dos impostos, parte dos seus rendimentos, indispensáveis à manutenção das funções sociais do Estado – a Escola Pública, a Saúde Pública, a Protecção Social Pública.
As “reformas” anunciadas pela direita, pelo governo, como necessárias ao desenvolvimento económico e à sustentabilidade do estado social, visam apenas o seu enfraquecimento ou a sua aniquilação por asfixia, por redução das verbas mínimas indispensáveis ao seu funcionamento. São verdadeiramente reformas anti-sociais, que têm como objectivo último retirar rendimentos à maioria da população para os entregar de mão beijada aos mais ricos. Enquanto se retiram rendimentos aos mais pobres e remediados através dos cortes salariais, cortes de pensões, cortes na Saúde e na Educação, diminuem-se os impostos às grandes empresas e não se procuram mais receitas para o Estado através de uma negociação justas das rendas especulativas da EDP ou das PPP. O governo toma o partido dos ricos, da classe social mais privilegiada, contra a grande maioria dos mais desfavorecidos, dos trabalhadores, dos pequenos industriais e comerciantes, da classe trabalhadora. Porque muitos pequenos industriais e pequenos comerciantes estão em vias de extinção engrossando a curto prazo a classe dos trabalhadores. É a lógica deste novo modelo social dominado pelo capitalismo financeiro. É uma nova ordem social, económica e política que visa impor aos portugueses, “custe o que custar” este novo modelo social e económico. É um verdeiro golpe de estrado tendo por objectivo restabelecer as relações de propriedade e rendimentos existentes ao tempo do antes do 25 de Abril de 1974.
Acreditar que o povo não compreende o que lhe querem roubar, e que não tem o direito de defender o 25 de Abril, de defender as conquistas democráticas que dele nasceram e fortificaram, é seguramente uma grande ilusão.
Só com a luta e com o levantamento popular será possível abortar este golpe de estado do governo e da classe dominante. Deixar o sucesso ou insucesso deste golpe de estado apenas nas mãos do Tribunal Constitucional é um erro. São os portugueses que terão de defender o 25 de Abril. Nunca como agora a união da esquerda (dos comunistas aos sociais democratas) é tão imperativa. A CGTP e a UGT terão de unir-se e mobilizar os cidadãos. O PS terá de definir-se de uma vez por todas, se deixa o “social liberalismo”, se se mantém em águas turvas, ora na defesa do estado social ora no acolhimento das políticas neoliberais como até aqui ou se se coloca definitivamente ao lado da defesa inequívoca das conquistas sociais do 25 de Abril de 1974. O tempo é de rupturas e não de conciliações. O neoliberalismo é o que é, e do mesmo modo que não se pode pedir a um gato que mude a sua natureza não poderá pedir-se ao neoliberalismo que altere a sua natureza, a delapidação do estado social, o aumento das desigualdades, o retrocesso civilizacional.
O PS não pode esperar por mudanças na Europa. Esta Europa controlada pela banca e pelo estado alemão onde o sonho democrático e social deu lugar ao pesadelo anti-social e antidemocrático. Esta Europa dominada pelo capital financeiro onde a Europa dos Povos não tem espaço nem lugar. Até quando teremos que esperar para que as esquerdas entendam que esta Europa não é alterável e que outra Europa é possível?
  Não nos esqueçamos da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, (Art.-º 35): “Quando o governo viola os direitos do povo, a insurreição é, para o povo e para cada segmento do povo, o mais sagrado dos direitos e o mais indispensável dos deveres”.

quinta-feira, novembro 28, 2013

Os mercados

Um documentário realizado por Adam Curtis revela a essência pueril e mecânica da teoria de Nash, donde os indivíduos, guiados pelo egoísmo, apelam à desconfiança e à traição. Também deita por terra as ideias dos economistas que cimentaram o modelo económico vigente desde começos dos anos 80, como Friedrich von Hayek y James Buchanan, que apelavam à redução do Estado, às privatizações e ao fim da democracia. Dizia-se que os mercados estavam tão ligados com a vida das pessoas, que não podia existir ninguém melhor habilitado que os mercados para resolver os seus problemas e responder democraticamente às suas necessidades e de um modo que não podia fazer a política.
“Os mercados são as únicas máquinas de votar reais; Se estas máquinas se mantiverem longe do alcance dos políticos e das regulações, chegarão a expressar fielmente a vontade da comunidade… e quem deve estar a cargo desta revolução que pela primeira vez na história tornará real a vontade da comunidade, são os banqueiros. Eles serão os encarregados de fazer com que isto ocorra”. (Friedrich von Hayek y James Buchanan).
Curtis fala-nos da visita que Alan Greenspan (presidente da Fed) e Robert Rubin (presidente de Goldman Sachs e logo Secretário do Tesouro dos Estados Unidos) realizaram ao recentemente eleito Bill Clinton, em 1992, para informá-lo que todo o seu programa de governo deverá ser abandonado porque o défice que herda de George Bush torna-o impossível. Assim, desde o seu primeiro dia de governo, Bill Clinton reduziu funcionários e programas públicos por ordens de Alan Greenspan e Goldman Sachs. Clinton foi o primeiro presidente que transferiu o seu poder para a banca. E desde Clinton, a banca começou a governar o mundo.
O resultado deste processo surge hoje à frente dos nossos olhos: a maior depressão mundial da história, sem alternativas reais de solução e com um futuro povoado de incertezas. A “democracia de mercado” baseou-se simplesmente na liberdade para comprar e delapidar tanto lixo o mais possível ainda que isto signifique um retrocesso crucial na qualidade de vida. Contrariamente ao que se prometia, o consumismo não foi uma etapa intermédia para o paraíso, mas bem o contrário, uma etapa intermédia para o inferno. E essa mesma banca que em 1992 tomou as rédeas do mundo, quinze anos mais tarde exigia ser resgatada com o dinheiro público, continuando a exigir resgates nos últimos cinco anos. A factura destes resgates supera já os 16 bilhões de dólares.
(ver em Elblog Salmón)

sexta-feira, novembro 22, 2013

O golpismo do governo

Na verdade o que se pretende é que o TC sancione uma profunda alteração estrutural do modelo económico e social do país. Porque uma forma de liquidar o estado social será retirar-lhe os recursos indispensáveis ao seu funcionamento. Uma “refundação” do Estado, como lhe chama Passos Coelho. As profundas alterações que se procuram não são meramente conjunturais, temporárias, exigidas pela grave situação económica e financeira do país, mas alterações estruturais, isto é, que se perpetuarão para além dos próximos anos.
  Refundar é alterar, mudar o modelo, a estrutura interna do Estado, enquanto reformar é melhorar essa estrutura conservando o seu modelo. E o que o governo deseja é na verdade alterar profundamente o modelo social. É verdadeiramente refundar o Estado. É, verdadeiramente, aniquilar o estado social da democracia portuguesa.
Passos e o seu governo têm consciência de que o Estado de bem-estar social e as suas políticas sociais, não são apenas uma “administração”, mas um modelo civilizacional. O seu objectivo é “custe o que custar”, demolir tal modelo e substituí-lo por outro.
O corte de 4.500 milhões de euros, proposto em orçamento de 2014, tendo como principais vitimas, os sectores da Educação, da Saúde e da Protecção Social, pilares do estado social, é o meio ardiloso que o governo engendrou para aniquilar de modo rápido e eficaz o que resta do estado social, depois de todos os cortes que nele têm sido infligidos ao longo destes dois últimos anos.
É uma tentativa de implantação de um novo projecto de reforma ideológica, económico e social. De uma verdadeira tentativa de golpe de estado. Um golpe de estado contra a cidadania, a democracia e os direitos democráticos e contra todas as conquistas sociais alcançadas com o 25 de Abril de 1974 consagradas na Constituição Portuguesa.
Os cortes retroactivos propostos são a demonstração do carácter golpista da actuação do governo e do seu desprezo pelo estado de direito.
  A esquerda portuguesa tem que rapidamente atender que aquilo que está realmente em causa é não apenas a aniquilação do estado social mas a tentativa de implantar um novo modelo social; onde prevaleça o individualismo e a desigualdade social(1); onde se mercantilizem as funções sociais do estado; onde os valores da igualdade, fraternidade e solidariedade sejam substituídos por um cenário de competição e concorrência selvática; onde somente os fortes sobrevivam cabendo aos fracos conformarem-se com a sua exclusão; onde os valores da solidariedade, fraternidade, abnegação, tolerância, benevolência, indulgência, sejam considerados retrógrados e favoráveis à estagnação económica; onde os cidadãos sejam vistos só e apenas como consumidores; onde se pretende alcançar a transformação material da realidade económica, política, jurídica e social e que esta transformação seja aceite como a única saída possível e dolorosa para a crise.
Os sociais-democratas, os socialistas, os comunistas os bloquistas, as centrais sindicais, as múltiplas associações de solidariedade, todos os democratas sem partido, têm que rapidamente sair para a rua em conjunto e na defesa do estado social e da democracia.
Porque, sem Escola pública, sem Saúde pública, sem Protecção social pública, pilares do estado social, não há igualdade de oportunidades nem solidariedade social e sem isso no fundo, não haverá Democracia. Um primeiro passo foi dado na reunião de ontem da aula magna da reitoria de Lisboa com o patrocínio de Mário Soares, cada vez mais lúcido e combativo.
Que as esquerdas convoquem quanto antes uma manifestação na Alameda de Lisboa de repúdio pelos desígnios obscuros e golpismo do governo. São as conquistas sociais do 25 de Abril, é o estado social, é a Democracia, que estão verdadeiramente em causa. Façamos da Alameda o 1º de Maio de 1974. Nunca como agora é tão necessária a mobilização popular.
(1)A desigualdade social é um estimulante que faz com que os mais talentosos desejem destacar-se e ascender ajudando dessa forma o progresso geral da sociedade. Tornar iguais os desiguais é contraproducente e conduz à estagnação. (W. Blake)

quinta-feira, novembro 21, 2013

Perder a paciência

A Troika portuguesa, Passos, Portas e Cavaco, devem pensar que o povo português é estupido e que podem impunemente continuar a enganá-lo. E que as famílias, os cidadãos, vão acatar docemente a miséria que lhes querem impor. Estão enganados se assim pensam.
Não são só as greves que se multiplicam por todo o lado e que alastram a todos os sectores de actividade que deveriam fazer pensar muito seriamente a nossa miserável Troika. O grito de inconformismo dado hoje por Mário Soares e muitos outros verdadeiros democratas e verdadeiros sociais-democratas deveria igualmente merecer muita atenção.
Mas, o que eles verdadeiramente devem temer é o mal-estar das forças de segurança, hoje bem expressa na manifestação que consegue agregar todos os ramos das forças de segurança.
Os portugueses não irão permitir, que a Troika portuguesa “refunde o estado”, isto é, altere o regime institucional que vigora desde o 25 de Abril de 1974, sob que pretexto for. Que destrua o estado social, a protecção social das famílias mais carenciadas, a Escola pública, a Saúde pública, conquistas dos portugueses com o 25 de Abril.
Os cortes, propostos em orçamento para 2014, nas funções sociais do Estado, tendo como principais vitimas, os sectores da Educação, da Saúde e da Protecção Social, é o meio ardiloso que o governo engendrou para aniquilar de modo rápido e eficaz o que resta do estado social, depois de todos os cortes que nele têm sido infligidos ao longo destes dois anos e meio. Aproveita ardilosamente a crise que o país atravessa, que ele próprio intencionalmente vem agravando, para forçar e tornar aceitável perante os portugueses, o “inevitável” corte de 4.500 milhões de euros.
Os portugueses não são parvos e já perceberam a marosca. Demitam-se enquanto é tempo. Sigam o conselho de Mário Soares ou então arrisquem e cuidem-se, porque o povo português está a perder a paciência (1) para vos aturar.
(1) Ora acontece que Miguel de Vasconcelos, quando se apercebeu que não podia fugir, escondeu-se num armário e fechou-se lá dentro, com uma arma. O que finalmente o denunciou foi o tamanho do armário. O fugitivo, ao tentar mudar de posição, remexeu-se lá dentro, o que provocou uma restolhada de papéis. Foi quanto bastou para os conspiradores rebentarem a porta e o crivarem de balas. Depois atiraram-no pela janela fora. O corpo caiu no meio de uma multidão enfurecida que largou sobre ele todo o seu ódio, cometendo verdadeiras atrocidades, sendo deixado no local da queda para ser lambido pelos cães, símbolo da mais pura profanação (Wikipedia)

terça-feira, novembro 19, 2013

Os pobres que paguem a crise

As despesas do Estado com compra de bens e serviços aumentaram de 2011 para 2012 mais de dois mil milhões de euros, segundo as contas de Valadares Tavares. O professor do Técnico e antigo presidente do Instituto Nacional da Administração diz que há aqui uma margem para cortar sem ir aos salários e pensões.
Os dados são da Direção-Geral do Orçamento e foram apresentados por Luís Valadares Tavares no programa Olhos nos Olhos na TVI24.
"Quando se soma tudo aquilo que é comprado, bens, serviços, contratos, rendas, etc. Dá uma verba que é praticamente igual à de pessoal", diz, questionando: "Como é que no ano de todos os sacrifícios, cortes de pensões, prestações sociais, etc, tivemos aqui esse aumento [dois mil milhões] tão grande".

segunda-feira, novembro 18, 2013

Os super-ricos duplicaram a riqueza


“Quando são os próprios ricos e os super-ricos que decidem primordialmente como se utiliza a riqueza, a sociedade tem problemas graves”.
 Apesar de que grande parte do mundo assistir a como os seus rendimentos se arruinaram, a riqueza dos multimilionários duplicou desde o início da crise. Isto é dito num relatório publicado por Wealth X and UBS, uma consultora que averigua os indivíduos super-ricos. De acordo com este relatório, a riqueza dos multimilionários do mundo passou de 3,1 bilhões de dólares no ano de 2009 a 6,5 bilhões de dólares no ano de 2013, cifra perto de 45% do PIB dos Estados Unidos, a maior economia do mundo. O número de milionários passou de 1.360 no ano de 2009 a 2.170 no ano de 2013. Estas 2.170 pessoas possuem uma riqueza equivalente a 10 por cento do produto bruto mundial.
Além de analisar a riqueza dos multimilionários do mundo, o relatório documenta as grandes somas gastas pelos multimilionários em artigos de luxo. Wealth X y UBS elaborou um estudo detalhado sobre o que procuram estes multimilionários. A título de exemplo, têm cerca de 126.000 milhões de dólares em iates, jets privados, obras de arte, antiguidades, moda, jóias e carros de coleção.
Este estrato social existe como um enorme fardo para a sociedade mundial, sem produzir nada de valor contudo monopoliza grandes recursos. Não só são grandes os recursos sociais dedicados ao seu enriquecimento pessoal, senão que o seu domínio sobre a vida económica e política actua como uma barreira a qualquer solução racional dos grandes problemas que enfrenta a humanidade. Os super-ricos controlam todos os aspectos da vida política em todo o mundo, com consequências desastrosas.
Este é o resultado inevitável do actual sistema capitalista, que trata a riqueza dos multimilionários como sacrossanta, e as necessidades da população, como a educação, o alojamento e a assistência na saúde, como prescindíveis.
(Ver em ElBlog Salmón)

segunda-feira, novembro 11, 2013

BCE baixa taxa de juros para 0,25%

A zona euro enfrenta um risco perigoso de deflação, muito semelhante ao Japão de princípios dos anos 90, e isto obrigará o BCE a tomar medidas ainda mais audazes como uma nova baixa dos juros e levar a taxa real de juros a nível negativo.
De acordo aos dados do Eurostat, o índice de preços ao consumidor baixou de 1,1% de Setembro a 0,7% em Outubro, o nível mais baixo desde o rebentar da crise em 2008. E perante a persistente queda do comércio mundial, tudo indica que pode continuar esta descida. A profunda desaceleração que sofre a Europa levou a perder o objectivo de 2 por cento anual na inflação e isto leva ao risco de submergir a Espanha, Itália e Portugal numa recessão ainda mais prolongada que infligiria sérias feridas à eurozona.
Se a inflação é o resultado de “muito dinheiro para poucos bens”; a deflação é o resultado de “pouco dinheiro para demasiados bens”. Se a crise afundou a velocidade de circulação do dinheiro, a velocidade na produção de bens segue imparável como resultado das poderosas forças industriais em marcha.
A deflação, ou uma inflação reduzida, é particularmente uma má notícia para a Europa dado que tende a asfixiar e imobilizar a economia. Se a inflação corrói o valor real da dívida e a torna mais fácil de suportar, a deflação consegue o contrário e a torna insustentável.
Se a inflação consegue “dissolver” a dívida e torna-la mais manejável, a deflação consegue o efeito oposto.

sábado, novembro 09, 2013

A Irlanda e Portugal

Agora, que a intervenção na Irlanda está prestes a acabar e quando o governo e os seus apoiantes tentam comparar o trajecto da Irlanda com o de Portugal será bom debruçarmo-nos um pouco sobre os percursos dos dois países antes e depois da crise financeira internacional que eclodiu em 2008.
As causas da intervenção na Irlanda são na verdade totalmente diferentes das causas que motivaram a intervenção na Grécia e em Portugal. E, ao serem diferentes essas causas, naturalmente que foi diferente a evolução temporal da intervenção bem como o sucesso ou insucesso da sua finalização.
Foram os activos tóxicos com origem nos EUA que destroçaram a banca da Irlanda associado a uma crise do imobiliário que levou a uma intervenção maciça do estado irlandês no resgate financeiro da banca que acabou por ser nacionalizada. Ora, em Portugal não tivemos uma crise imobiliária nem os activos tóxicos atingiram tão duramente a nossa banca como na Irlanda. Verifica-se também que nos anos anteriores à crise os caminhos de Portugal e da Irlanda eram bem diferentes. Enquanto Portugal tinha uma dívida pública próxima dos 70% do PIB (2007) a Irlanda possuía uma dívida inferior a 25%, mercê dos fortes crescimento económicos sem défices públicos (ao contrário, com superavits em 2000 teve um +4,8% do PIB enquanto Portugal teve um défice de – 2,9%e em 2005 teve +1,6% enquanto Portugal teve um défice de -6,1%.
Por outro lado a realidade económica e social Irlandesa era e é muito diferente da portuguesa. O salário mínimo na Irlanda era de 1.462 euros em 2011 quando em Portugal era e é de 566 euros (salário bruto); o PIB por habitante (2012 em SPA) é de 130 na Irlanda e 75 em Portugal; o esforço fiscal em 2008 era de 0,08 na Irlanda enquanto em Portugal era, no mesmo ano, de 0,23; ou ainda, no Índice de Desenvolvimento Humano 2012 das nações Unidas a Irlanda surge na 7ª posição enquanto Portugal aparece na 43ª.
Daí que será muito difícil a Portugal ter um sucesso como o da Irlanda. Mas compreende-se esta tentativa do governo em tentar identificar Portugal com a Irlanda. Pretende-se passar a ideia de que “se formos obedientes e fizermos o que nos mandam”, isto é, contemporizarmos com as medidas inconstitucionais inscritas no orçamento de estado para 2014, teremos um "futuro radioso" como o da Irlanda. Como se mais austeridade fosse o caminho para sairmos da austeridade.
Na verdade, o que se deseja é que o TC sancione tais medidas, isto é, sancione uma profunda alteração estrutural do modelo económico e social do país.
Uma “refundação” do Estado, como lhe chamou Passos Coelho. As profundas alterações que se procuram não são meramente conjunturais, temporárias, exigidas pela grave situação económica e financeira do país, mas alterações estruturais, isto é, que se perpetuarão para além dos próximos anos.
Anseia-se pela concretização do projecto neoliberal do estado mínimo. A ortodoxia neoliberal tem consciência de que o Estado de bem-estar social e as suas políticas sociais, não são apenas uma “administração”, mas um modelo civilizacional. As narrativas da neodireita, estão assim voltadas para demolir este modelo e substituí-lo por outro. É uma tentativa de implantação de um novo projecto de reforma ideológica, económico e social. De uma verdadeira tentativa de golpe de estado. Um golpe de estado contra a cidadania, a democracia e os direitos democráticos e contra todas as conquistas sociais alcançadas com o 25 de Abril de 1974 consagradas na Constituição Portuguesa.
Tratam-se os direitos sociais como privilégios e os verdadeiros privilégios (PPP, rendas EDP,…) como direitos.

sexta-feira, novembro 08, 2013

Controlar os preços á custa do estrangulamento da economia.

É provável que vivamos os últimos estertores do Modelo Económico Neoliberal tal como foi implantado há 30 anos. E o paradoxo é que a queda deste modelo será produto da sua própria origem: o controlo da inflação e da massa monetária.
O Marco Monetário de Milton Friedman (Monetary Framework, 1963) é uma variante da Teoria Quantitativa do Dinheiro (TQM) desenvolvida por David Hume em 1750. Segundo a TQM todo o aumento dos preços se deve ao aumento na quantidade de dinheiro. A reelaboração de Friedman deste conceito levou-o a idealizar uma solução para resolver os problemas inflacionários dos anos 60 e 70 a partir do controlo da quantidade de dinheiro necessário na economia.
O aumento dos preços afecta quem vive de um salário fixo, pois reduz-lhe o seu poder aquisitivo. Mas, e o que se passa se perde o emprego? Aí ficará com zero poder aquisitivo. Por isso não pode ser o único factor a ter em conta. E aí está o engano.
As políticas neoliberais fizeram o mesmo: preocuparam-se em controlar os preços à custa de estrangular a economia. E por certo, não lhes preocupa que haja mais desemprego: na hora de negociar terão sempre trabalhadores dispostos a trabalhar pelo salário mínimo. O controlo da inflação foi o engano do modelo económico vigente. E como prova disso, basta rever os dados da distribuição dos rendimentos em todos os países que seguiram a norma: em todos eles se ampliaram as desigualdades entre ricos e pobres.
O que é mais importante: cuidar do emprego, ou cuidar dos preços? A propósito, uma leve recordação sobre as políticas prévias à aplicação do modelo neoliberal: entre os anos 1940 e 1970 existiram fortes altas na inflação, mas o desemprego e o endividamento estavam sob controlo, e também foi o período de maior equidade social. Ao tentar controlar a variável preços aumentou o desemprego e o endividamento massivo.

quinta-feira, novembro 07, 2013

“Economia milagrosa”

A colocação de uma previsão de aumento de desemprego inscrita no orçamento para 2014 está sem dúvida em perfeita harmonia com o crescimento económico que o governo espera para o próximo ano. É por esta razão, de conciliação do crescimento económico com o aumento de desemprego que o novo ministro da economia chama apropriadamente à situação “milagre económico”.
O facto de Portugal registar a segunda maior quebra da produção industrial em Setembro, entre os 27 Estados-membros da União Europeia, ao conhecer um recuo de 5,8% relativamente a Agosto (Eurostat) ou o índice de volume de negócios no comércio a retalho terem passado de uma variação homóloga de -0,4%, em Agosto, para -2,1% em Setembro. (INE) ou ainda as exportações de bens em Portugal registaram uma variação nula em Agosto, face ao mesmo mês do ano passado, sendo que face a Julho deste ano a queda foi de 23,8% (INE), é igualmente uma particularidade deste “crescimento milagroso”.
O que também não deixa de ser “milagre” é a descida do desemprego deste trimestre face ao anterior, embora tenhamos menos 102.700 pessoas empregadas em relação ao mesmo mês de 2012. Há quem justifique esta contradição com a emigração de mais de 10.000 portugueses por mês em busca de trabalho. Seguramente que para o governo esta interpretação não fará qualquer sentido pois tudo estará no pacote do tal “milagre económico”.
E, agora que uma vez mais a Troika portuguesa (Portas/Cavaco/Passos) nos quer fazer crer que se acabou a crise e que vêm aí novos bons tempos se formos obedientes e fizermos o que nos dizem, seria bom que estes troikanos portugueses e os seus apoiantes reparassem nestes indicadores e numa Europa que entrou em deflação.

sem comentários

(retirado do qaurtarepublica)

quarta-feira, novembro 06, 2013

Será este o Estado mínimo desejado pelos neoliberais?

O Estado injectou em 2012 perto de sete mil milhões de euros no sistema financeiro português, dos quais se destacam 5.850 milhões para a capitalização do BCP, BPI e CGD. Acrescem ainda cerca de mil milhões de empréstimos aos dois fundos que absorveram os activos tóxicos do BPN (Parups e Parvalorem). Estas são conclusões da análise à execução orçamental do ano passado tomada pública pelo Tribunal de Contas (TC).
As necessidades financeiras da banca, sublinha o TC, deram um contributo decisivo para o aumento da despesa com activos financeiros que, em 2012, ascendeu a cerca de 11,5 mil milhões de euros (perto de 7 por cento do PIB), mais 4,8 mil milhões que no ano anterior.
O Tribunal destaca que os activos financeiros "aumentaram 4.771,5 milhões de euros, atingindo os 11.495,4 milhões de euros, passando a representar 18,2 por cento da despesa [do Estado]", em resultado principalmente dos "instrumentos de capital contingente" para capitalização de três instituições de crédito [BCP, BPI e CGD], em 2012, que ascenderam a 5.100 milhões de euros".
Este valor não inclui os 750 milhões de euros de dotação directa de capital na CGD, nem os mil milhões de euros emprestados à Parups e à Parvalorem. Com estas despesas adicionais, o Estado injectou 6.883 milhões de euros no sistema financeiro português.
Para o total dos gastos com activos financeiros concorrem outras três rubricas: 2.749 milhões de euros de empréstimos de médio e longo prazo a empresas públicas que deixaram de ter acesso a crédito bancário, cerca de 800 milhões de euros da participação no capital do Mecanismo de Estabilização Financeira (MEE) - o novo fundo de resgate europeu - e ainda 900 milhões de empréstimos às regiões autónomas e autarquias.
Em 2011 o Estado tinha gasto 600 milhões de euros com um aumento de capital do BPN e este ano já injectou cerca de 1.100 milhões no Banif. (em In VERBIS)
Será este o Estado mínimo desejado pelos neoliberais?
Máximo para ajudar a banca e os banqueiros e mínimo para ajudar as pessoas?

terça-feira, novembro 05, 2013

A banca planeia uma expropriação em grande escala

O volume do incumprimento dos pagamentos de dívida (dos calotes) nos bancos europeus alcançou os 1,2 bilhões de euros no final do ano de 2012, duplicando o nível existente no final do ano de 2008. Em quatro anos, o volume dos créditos não pagos aumentou de 514.000 milhões de euros para 1,187 bilhões de euros, de acordo com a última auditoria de PricewaterhouseCoopers (PwC). Este agravamento deve-se, em grande medida, à delicada situação económica em que vivem a Irlanda, Espanha, Portugal e Itália. Nos próximos anos os “calotes” aumentarão devido ao instável clima económico que sacode as economias europeias, e porque ainda existem mais de 2,4 bilhões de euros em activos tóxicos que as entidades financeiras querem liquidar com vista à anunciada ronda de novas provas de resistência por parte do Banco Central Europeu.
Daí que a banca planeia uma expropriação em grande escala… e que será completamente legal. Ontem passou inadvertida a notícia do novo apoio à banca espanhola de 28.000 milhões de euros, que traduz parte destas espoliações do dinheiro público.
Isto dá uma ideia do modo como a banca pretende trocar o bom dinheiro dos contribuintes, pelo lixo tóxico que atafulham os seus balanços. Uma vez mais o resgate do sistema financeiro será socializado na maior expropriação do dinheiro público. Não será já só o dinheiro dos clientes e depositantes senão novamente com os fundos públicos.
Isto demonstra no que se converteu o sistema financeiro com a globalização e a desregulação do dinheiro virtual. Está a evitar-se a autodestruição do sistema financeiro por essa via da expropriação tão criticada aos Kirchner ou aos Chávez, essa palavra tão feia e impossível de imaginar na Europa de Ângela Merkel. Sem dúvida, desta vez a expropriação se faz à vista de todos os europeus e ninguém diz nada. O mais incrível é que esta expropriação é de grande alcance e completamente legal.
Isto torna visível a farsa do sistema financeiro, que cria dinheiro do nada na procriação de empréstimos, e põe em movimento um volume de dinheiro de 50 ou 100 vezes maior que o dinheiro verdadeiro, conseguindo suculentos benefícios em cada transacção, e que se reproduzem igualmente pela via dos lucros. Esta maquinaria, conhecida também como o esquema Ponzi das finanças globais, é a mãe das grandes crises financeiras de que a actual crise é um dos seus mais claros resultados.
Depois de cinco anos de crise, a banca europeia ainda mantem 2,4 bilhões de euros em activos tóxicos e desfazer-se deles é o verdadeiro cancro que pesa na recuperação e saída da crise.
(Ver em ElBlogSalmón)

segunda-feira, novembro 04, 2013

Queda do comércio mundial marca o fim do modelo baseado nas exportações

O último relatório da UNCTAD de 12.09.2013 (Organização para o Comércio e Desenvolvimento das Nações Unidas),relata que “a actividade do comércio internacional estagnou o que demonstra que já não se trata só de uma crise financeira, mas que é uma crise estrutural que envolve toda a economia mundial.”
Antes do rebentar da crise uma procura próspera parecia justificar a adopção de modelos de crescimento orientados às exportações. Muitos países competiam por exportar mais e acumular a moeda de reserva, apostando assim no seu próprio crescimento. Esta expansão se baseava na procura global e o auge do comércio externo, que obedecia a padrões de financiamento insustentáveis, terminaram colapsando. A mudança estrutural deve apelar a uma nova estratégia de crescimento que favoreça o desenvolvimento interno e apele ao factor chave e central que é a criação de emprego.
E aponta caminhos, “os países devem introduzir mudanças fundamentais nas suas estratégias de crescimento, com o objectivo de adaptar-se a esta mudança estrutural”. Mais concretamente, “Ao adoptar uma estratégia de crescimento com um papel mais importante para a procura interna, os países devem alcançar um equilíbrio adequado entre o aumento do consumo das famílias, o investimento privada e a despesa pública. O fomento da capacidade aquisitiva da população é um elemento chave neste sentido. Isto só pode alcançar-se através de uma política de rendimentos, com transferências sociais específicas e planos de empregos no sector público. A criação e redistribuição de rendimentos às famílias de rendimentos médios, é fundamental para esta estratégia de desenvolvimento, já que as famílias tendem a gastar uma maior proporção dos seus rendimentos no consumo, em bens e serviços produzidos na região”.
O relatório da UNCTAD assinala ainda, que os países desenvolvidos devem fazer frente às causas fundamentais da crise, que se podem resumir a quatro pontos:
1.A diminuição das funções económicas do Estado
2.O aumento da desigualdade social
3.O papel predominante do sector financeiro desregulado
4.O papel global do sistema financeiro na criação dos desequilíbrios mundiais, dado que as economias emergentes se tornaram fortemente dependentes das suas exportações. A queda do comércio obrigará a estas economias a ter um papel mais centrado na procura interna e regional.
Enfim, tudo ao contrário das políticas da TroiKa e do governo Passos/Portas.
(Ver em Elblogsálmon)

sexta-feira, novembro 01, 2013

O Panfleto (guião)

O panfleto (guião) apresentado pelo ministro Portas, com toda a pompa e circunstância, não passa disso mesmo. A reforma do estado, algo que deveria merecer o maior respeito por parte do governo, é tratada por Portas de uma forma panfletária. O panfleto é um somatório de generalidades, vago, desordenado e sem qualquer pretensão séria de abordagem de uma autêntica reforma do estado. Sendo assim, é impossível qualquer tratamento sério, qualquer início de crítica a estas 112 páginas de papel A4.
Mas como panfleto serviu perfeitamente as intenções do governo. Serviu como manobra política para atingir o PS em dia de discussão do orçamento para 2014.
Tornou-se evidente ao longo dos últimos meses (anos) que o governo não quer nenhuma reforma do estado, quer sim a liquidação do estado social como resultado dos cortes que aplica nas funções sociais do estado. Quer a refundação do estado, não a sua reforma.
A refundação do estado é um novo projecto político de transformação social sonhado pela neodireita portuguesa.
Passos Coelho sabia bem o que queria quando falava em refundação do Estado, e não em reforma do Estado. Refundar é alterar, mudar o modelo, a estrutura interna do Estado, enquanto reformar é melhorar essa estrutura conservando o seu modelo. E, o que o governo deseja é na verdade alterar profundamente o modelo social. É verdadeiramente refundar o Estado. É, verdadeiramente, aniquilar o Estado social-democrata da República Portuguesa.