terça-feira, dezembro 13, 2011

cumplicidade activa

Está claro que não existe, no seio da União Europeia (UE), nenhuma vontade política de enfrentar os mercados e resolver a crise. Até agora atribuía-se à lamentável actuação dos dirigentes europeus à sua desmedida incompetência. Mas esta explicação (ainda que justa) não basta, sobretudo depois dos recentes “golpes de Estado financeiros”, na Grécia e na Itália. Torna-se óbvio que não se trata apenas de mediocridade e de incompetência, mas de cumplicidade activa com os mercados.
A que chamamos “mercados”? A esse conjunto de bancos de investimento, companhias de seguros, fundos de pensões e fundos especulativos (hedge funds) que compram e vendem essencialmente quatro tipos de activos: divisas, acções, obrigações dos Estados e produtos derivados.
Para ter una ideia da sua colossal força basta comparar duas cifras: em cada ano, a economia real (empresas de bens e de serviços) cria, em todo o mundo, uma riqueza (PIB) estimada em 45 bilhões de euros. Enquanto, no mesmo tempo, à escala planetária, na esfera financeira, os “mercados” movem capitais num valor de 3.450 bilhões de euros. Ou seja, setenta e cinco vezes o que produz a economia real...
Consequência: nenhuma economia nacional, por mais poderosa que seja (Itália é a oitava economia mundial), pode resistir aos assaltos dos mercados quando estes decidem atacá-la de forma coordenada, como acontece desde há mais de um ano contra os países europeus depreciativamente qualificados de PIIGS (porcos, em inglês): Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha.
O pior é que, contrariamente ao que poderia pensar-se, esses “mercados” não são forças exóticas vindas de algum horizonte distante para agredir as nossas gentis economias. Não. Em sua maioria, os “atacantes” são os nossos próprios bancos europeus (esses mesmos que, com o nosso dinheiro, os Estados da UE salvaram em 2008). Para dizê-lo de outra maneira, não são só fundos estadounidenses, chineses, japoneses ou árabes os que estão atacando massivamente algunos países da zona euro.
Trata-se, essencialmente, de uma agressão desde dentro, vinda do interior. Dirigida pelos próprios bancos europeus, as companhias europeias de seguros, os fundos especulativos europeus, os fundos europeus de pensões, as instituições financeiras europeias que administram as poupanças dos europeus. Eles são quem possui a parte principal da dívida soberana europeia. E quem, para defender – em teoria – os interesses dos seus clientes, especulam fazendo aumentar os juros que pagam os Estados endividados, até levar a vários destes (Irlanda, Portugal, Grécia) a muito perto da bancarrota. Com o consequente castigo para os cidadãos que devem suportar as medidas de austeridade e os brutais ajustes decididos pelos governos europeus para acalmar os “mercados”, ou seja, os seus próprios bancos...

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