sábado, julho 28, 2012

Zelosos mandatários

O cidadão comum europeu interroga-se com razão – como é possível que países desenvolvidos, com fortes economias como a Espanha, em 2007 com uma dívida pública diminuta, inferior a 40% do PIB (muito aquém da média dos países mais desenvolvidos, inferior à da Alemanha), com um superavit das suas contas públicas (também aqui numa situação favorável e melhor que a da Alemanha) se encontre agora com o custo da sua dívida a juros insuportáveis?
Como foi possível a Espanha cair no mesmo círculo vicioso em que caíram a Grécia, a Irlanda e Portugal, um país com uma economia superior em dobro às economias somadas daqueles três países? Um círculo vicioso, uma espiral suicida sem fim à vista, que se desenvolve em vários actos.
Primeiro acto - a especulação dos “mercados” financeiros encarece o custo da dívida.
Segundo acto - os governos anunciam cortes e aumento de impostos para acalmar os “mercados”.
Terceiro acto - os “mercados” aliviam e multiplicam-se os sorrisos durante alguns dias ou apenas algumas horas; a Alemanha o FMI e o Banco Central Europeu elogiam as corajosas medidas adoptadas, mas alertam que é necessário um maior esforço.
Quarto acto - renova-se a especulação dos “mercados” e repetem-se, pela mesma ordem e com os mesmos actores, todos os actos anteriormente representados.
Os governantes europeus têm demonstrado uma total e confrangedora incapacidade para superarem a actual crise. Nem outra coisa seria de esperar. Então não foram as políticas destes governantes que levaram os países à crise em que agora se encontram? Como então esperar deles uma efectiva solução de superação da crise? Com as suas políticas neoliberais de globalização dos mercados completamente desregulados que outra coisa se poderia prever? Estes governantes parecem não entender o actual funcionamento altamente perverso dos mercados financeiros, razão primeira e fundamental da actual crise. Torna-se mesmo caricato, absurdo e estúpido o apelo que alguns fazem aos seus cidadãos para aceitarem a austeridade como condição para “acalmar os mercados”. Criaram um monstro, um mercado financeiro global completamente desregulado e agora queixam- se da sua voracidade, da sua ganancia, da sua falta de “moderação”.
Qualquer especulador, em qualquer parte do mundo e a qualquer hora, pode aceder aos “mercados” e negociar qualquer commodities, petróleo, arroz, açúcar café, soja, trigo, cobre, comprar milhares de barris de petróleo ou toneladas de arroz, sem que alguma vez pense em consumi-los. O que o move é a expectativa de vendê-los com lucro. Não é a maior ou menor produção ocasional de uma mercadoria, como seria normal, que afecta o seu preço no mercado mas a acção determinada e consertada dos especuladores. Num dia o preço do petróleo sobe não porque a diminuição da produção se tenha verificado nesse dia mas apenas por acção dos especuladores. E o dinheiro que entra em especulação é imenso. Num estudo recente do The Guardian, o enriquecimento dos multimilionários através dos paraísos fiscais, soma mais de 21 bilhões de dólares, (o PIB somado dos USA e Japão) e a cifra pode chegar aos 32 bilhões como afirma o artigo. É este o “admirável” mundo do mercado financeiro globalizado livre, leia-se desregulado, criado e alimentado pelas elites governantes europeias e dos USA.
Com uma agravante – os especuladores lembraram-se, com êxito, face às altas rentabilidades que experimentaram, de atacar de igual modo e com a mesma determinação as dívidas públicas dos países soberanos. É esta brutal especulação, nunca antes observada, que tem arrastado os países europeus, primeiro os economicamente mais débeis, para as crises económicas e sociais sem fim à vista.
E será por esta razão, a manterem-se as actuais “liberdades” dos mercados financeiros, que jamais se poderá ultrapassar a chamada crise das dívidas soberanas por mais austeridade que estupida e criminosamente se imponham aos povos. Torna-se penoso, observarmos como a crise se tem arrastado, cimeira após cimeira, com os líderes europeus a assistirem apáticos à especulação dos mercados ao mesmo tempo que vêm impondo injustificadas e desajustadas políticas de austeridade. Não têm motivação nem capacidade para enfrentarem os mercados, os especuladores, as instituições financeiras. Porque na verdade agem como seus mais zelosos mandatários.

2 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Ora é preciso é que fique algum....e o resto que se lixe....


...até as eleições...que se lixem...

6:39 PM  
Anonymous Anônimo said...

E por falar em tristeza....

e esta...??...

....diz Paul Krugman em " Acabem com esta crise já " a fls 124....." Lembram-se de Phil Gramm, e ex-senador que arquitectou a revogação da Lei Glass-Steagall e depois foi trabalhar para a indústria financeira ? Em 2008 foi um dos consultores do candidato presidencial John McCain e em julho desse mesmo ano declarou que nos encontràvamos apenas numa « recessão mental » e não numa « recessão real », concluindo da seguinte forma « Tornàmo-nos numa espécie de nação piegas » ..."

...olha !....olha !...agora percebo...a rapaziada lê muitos jornais estrangeiros....e não faz nada que não seja copiado...

6:51 PM  

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