O CONFRONTO IDEOLÓGICO NO EURO
O Neoliberalismo
Nestes
tempos de crise económica, financeira e social que se arrasta há anos por essa
Europa fora, existem duas principais correntes ideológicas que anunciam como
objectivos, e em cada um dos países do euro, “promover o crescimento económico e colocar as finanças públicas
equilibradas”.
Uma delas
tem vivido connosco nestes últimos quatro anos, a corrente neoliberal, que
preconiza como forma de atingir tais objectivos a chamada “austeridade
expansionista” privilegiando acima de tudo a “colocação das contas públicas em
ordem” como condição primeira para a promoção do crescimento e que, desgraçadamente,
como a realidade vem demonstrando, de austeridade tem tudo e de expansionismo nada
tem, e que é aplicada e defendida, quer pelos “talibans” do euro-grupo, quer
pelos partidos neoliberais que hoje detêm a supremacia política na Europa do
euro.
Advoga como
princípios fundamentais as privatizações do património do Estado, a entrega ao sector
privado as funções sociais do Estado na Saúde, Educação e Segurança Social e,
deste modo, extinguir ou minimizar ao máximo o chamado estado social, a desregulação dos mercados financeiros, a
desregulação do mercado de trabalho, a livre circulação de bens e capitais, a
redução de impostos sobre o capital, enfim, as chamadas “reformas estruturais”
neoliberais.
Na verdade,
a realidade vivida nestes últimos anos na Europa do euro veio demonstrar a
qualquer observador isento, a falácia da chamada austeridade expansionista e das
suas “reformas estruturais” e que, o acerto das contas públicas pela sua
aplicação através de aumento de impostos sobre o trabalho, a redução dos
salários, os cortes sociais e as privatizações provocaram devastadores efeitos
recessivos, com diminuição do número de empregados face á falência de muita
médias e pequenas empresas, aumento do desemprego, diminuição da riqueza
produzida no país, aumento da desigualdade social, aumento da pobreza,
diminuição do Investimento, emigração galopante e um aumento vertiginosos da
Dívida Pública. A Espanha, por exemplo, tinha uma dívida pública na ordem dos
40% do PIB em 2008 e hoje já supera os 100% do PIB, pelo que são muito muito
difíceis de reconhecer os benefícios no “acerto das contas públicas” com tal
política. No caso português, se calcularmos a média do défice real dos anos da
governação do PPD/PP, 2012, 1013, 1014 e 2015, obtém-se uma média anual do
défice de 5,50% do PIB, não muito longe portanto da média do défice de 6,30% do
PIB da governação de Sócrates 2005, 2006, 2007, 2008, 2009 e 2010, e se algum mérito
possa existir com a aplicação das medidas de austeridade, ela não é comparável
com a brutal regressão social, económica
e financeira do país (aumento da pobreza, desemprego e desigualdade, falência de muitas pequenas e médias
empresas, diminuição do Investimento e diminuição da riqueza produzida, aumento
do crédito mal parado, crise e falência dos Bancos e aumento da dívida pública
e dívida externa).
Entretanto
os 1% mais ricos aumentaram nestes últimos anos de “crise” a sua já colossal
fortuna.
O portal
financeiro Bloomberg vaticinou recentemente que as fortunas das pessoas que
possuem 100 milhões de dólares ou mais aumentarão anualmente em cerca de 9,5%
até ao ano 2020. Por outro lado, diz ainda o Bloomberg, que é espectável que os
activos dos paraísos fiscais registados em Hong Kong e Singapura aumentarão
anualmente cerca de 10%.
Por sua vez,
as conclusões de um relatório recente sobre a riqueza mundial divulgado pelo
Crédit Suisse referem que o 1% da população mundial, a mais rica, tem tanto
dinheiro como os restantes 99%. Ou seja, 1% do total da população possui metade
do valor total de activos disponíveis no mundo. E adianta que a crise que
eclodiu em 2008 está a contribuir cada vez mais para agravar o fosso entre
ricos e pobres.
É para
satisfazer os interesses desta pequena mas poderosa camada da população que o
neoliberalismo existe e se esforça por aplicar as suas políticas de
“austeridade expansionista”, isto é, austeridade para a esmagadora maioria da
população e expansionismo dos lucros e rendimentos dos muito ricos.
O Keysianismo
Uma outra
corrente ideológica alicerçada nos fundamentos Keynesianos e nos princípios
sociais-democratas opõem-se radicalmente aos fundamentos do neoliberalismo. Defende
o estado social e as funções sociais
do estado, a regulação do mercado de trabalho e os sindicatos, a regulação de
capitais, os impostos progressivos sobre o capital e os rendimentos do trabalho
e manifesta-se contra a privatização dos sectores estratégicos da economia.
E,
naturalmente que é contrária à falácia da “austeridade expansionista” que tem
como um dos primeiros propósitos a chamada “desvalorização competitiva” baseada
na redução de salários, no embaratecimento dos despedimentos e na precarização
do emprego.
Na verdade,
a prova de quanto falsa e errada é a doutrina neoliberal reside no facto que a sua
aplicação no combate à crise económica, financeira e social desencadeada em
2008 não ofereceu quaisquer resultados mantendo-se a crise longe de se
encontrar superada. Já lá vão oito anos em que a aplicação das políticas e das
reformas neoliberais estão muito longe de dar resultados. O desemprego continua
muito alto e as economias dos países do euro continuam em recessão ou com
crescimentos económicos muito débeis. A recuperação anunciada, a cada ano que
passa pelos defensores do neoliberalismo tarda em aparecer, enquanto permanece
o marasmo económico e o desemprego e se acentuam as desigualdades sociais e a
pobreza.
Os “talibans” neoliberais do
euro-grupo
Os “talibans”
neoliberais do euro-grupo impuseram aos países do euro, em especial aos mais
afectados pela crise, a sua receita neoliberal e desprezaram a aplicação dos
princípios keynesianos no combate á crise de 2007/2008.
Enquanto os
neoliberais acreditam que “o mercado se regula por si próprio como “mão
invisível”, e assim considerarem que “se
há desemprego então deverão reduzir-se os salários. Se esta diminuição dos
salários não é capaz de gerar emprego, então é preciso continuar a baixar os
salários”, como postulava Friedman um dos seus teóricos, ao contrário,
Keynes, demonstrou que o factor responsável
pela variação do volume do emprego é a procura de mão-de-obra, e não a sua
oferta e assim o desemprego é o resultado de uma Procura insuficiente de bens e
serviços, e somente pode ser resolvido por meio de investimentos. Quando o consumo
e as expectativas se deprimem, o investimento privado contrai-se e não pode
constituir o motor para impulsionar uma economia. O consumo e o investimento
público são então a alternativa para suprir a deficiência da Procura.
As políticas
de austeridade que hoje se aplicam na Europa são a antítese desta visão e representam
o regresso a uma cega ortodoxia que nega a realidade.
E, a União
Europeia possui estruturas e meios capazes de ultrapassarem rapidamente a crise
em que vive se adoptasse uma política alternativa assente no investimento
público como forma de dinamizar a Procura. E, poderia fazê-lo sem colocar os
países fora dos défices excessivos. Bastaria para tanto que os fundos
comunitários fossem duplicados, triplicados ou mais, nos países em maiores
dificuldades, Portugal, Grécia, Espanha e Itália, e reduzissem ao mínimo a
participação dos países nos custos dos projectos assim financiados.
Os bancos (mas
também as grandes empresas e os super-ricos), possuem muito dinheiro (reflexo
disso são as taxas de juros negativas), mercê da compra de dívida em mercado
secundário por parte do BCE, só que, com a economia estagnada, não parecem
querer correr riscos investindo no crédito às pequenas e às médias empresas. Preferem
depositá-lo no BCE ainda que a taxas de juro negativas, isto é, pagam para que
lhe guardem o seu dinheiro.
Assim, a
economia continua sem qualquer recuperação visível e com a ameaça da deflação, ao
mesmo tempo que o dinheiro continua parado, armazenado e sem servir a sua
principal função de meio de circulação.
Torna-se
impensável uma recuperação económica satisfatória assente nas políticas “da
austeridade para sair da austeridade” como o “derrotado” líder do PPD, Passos
Coelho, insiste em fazer crer.
Algumas
vozes, vindas do mundo neoliberal, começam agora a surgir colocando em causa os
dogmas porque se rege, como aconteceu recentemente num artigo publicado na
principal revista do FMI. Contudo, não se espera para breve uma alteração das
políticas neoliberais. Com a Europa a desfazer-se e sem propostas alternativas,
as lideranças europeias, reféns da Alemanha, mostram-se cada vez mais
arrogantes e agarradas às suas crenças e dogmas.
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